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Estúdio Pierrot, o maior vilão de Naruto Shippuden


Se você não é fã de animes você vai se surpreender quando eu digo que Naruto Shippuden é de fato uma obra sensacional, você já deve ter escutado isso por aí, talvez daquele seu amigo adolescente e para quem não acompanha animes, geralmente surge um preconceito não com o anime em si, mas com o que há de mais mainstream no ramo, que hoje em dia é o caso de Naruto. Para quem ama anime nada disso do que eu vou falar é novidade, Naruto é de fato incrível, mas quem o acompanha sabe que hoje em dia está mais fácil assistir essa obra por vontade de gostar dela do que de assistir pela qualidade que ela tem, e porque isso? Bem, digamos que Naruto está numa fase em que ele tem um péssimo vilão e eu não estou falando de Uchiha Madara e sim doEstúdio Pierrot, vilão não apenas de Naruto, mas de diversas animações por aí.

Antes de seguir, vale explicar que o Estúdio Pierrot é um estúdio japonês que não é criticado apenas no lado ocidental do planeta, mas que surpreendentemente até algumas pessoas no próprio Japão o enxerga como um mal e acredite, eu nem estou falando só pela péssima qualidade do material que eles entregam, o problema é mais grave e vai muito além disso.

Mas antes de entrar nos problemas mais graves do Estúdio Pierrot eu vou falar na qualidade do que eles produzem e para isso eu vou ter que mencionar uma série não japonesa, mas que eu e muitos amam: A Lenda de Korra. O processo americano de fazer desenhos é muito diferente do japonês, aqui no ocidente costuma-se fazer desenhos por temporadas como qualquer série de TV, ou seja, de 10 a 30 episódios no máximo por ano num caso normal, enquanto no Japão eles estão acostumados com episódios diários de um anime que é exibido em horário nobre.



Ainda assim, o excesso de critério na qualidade da primeira temporada de A Lenda de Korra foi tão alto que mesmo 12 episódios foi demais para o sul-coreano Estúdio Mir, que abandonou a série na primeira temporada e foram trabalhar em outro anime, que fez a Nickelodeon contratar oEstúdio Pierrot para a segunda temporada de Korra. O resultado, para quem é menos detalhista pode ter passado despercebido, mas para alguém criterioso como Bryan Konietzko e muitos fãs de Avatar, foi desastroso, o que obrigou a Nickelodeon a refazer o contrato com o Estúdio Mir no meio da temporada e que durou até o final da série em seu quarto ano, para nossa felicidade.

O caso de A Lenda de Korra é um dos mais famosos quando discutimos sobre a falta de qualidade dos trabalhos desse estúdio, mas porque então meu foco nessa matéria é em Naruto Shippuden? Por dois motivos, o primeiro porque esse é o carro chefe e o principal produto do estúdio e o segundo porque por melhor que a história e a série sejam, o trabalho que o Estúdio Pierrot faz torna quase impossível que alguém queira acompanhar o anime.

Eu desisti de Naruto há um tempo, depois do fiasco visual que foi o final do arco do Pain, (que eu ainda acredito que foi um protesto dos funcionários do estúdio) mas recentemente eu decidi voltar a assistir e vi que tinha perdido mais de 200 episódios e o mais legal disso, é que eu conseguia assistir 20 episódios por hora.



Sim, eu não errei a conta, cada episódio de Naruto tem em média 22 minutos então 20 episódios deveriam demorar 7 horas e meia, certo? Não, nesse caso. O trabalho do estúdio Pierrot com Naruto consiste em uma média de 4 minutos inéditos de episódio nos 20 minutos de duração dele, isso quando chega a tanto. Vamos à matemática?

Naruto tem uma abertura e uma finalização longas, que diferentes da animação em si têm uma boa qualidade visual, juntas já tomam 5 minutos desses 22. O inicio do episódio de um desenho geralmente começa dos últimos minutos do episódio anterior para te relembrar o que aconteceu, mas eu cheguei a marcar e tem episódios de Naruto que chegaram a ter absurdos 7 minutos finais do episódio anterior, como o inicio do episódio seguinte. SETE MINUTOS! E aí no meio disso tudo nós temos as famosas lembranças e flashbacks.

Naruto é uma série com personagens extraordinários e eles são assim graças à forma como a narrativa da série corre, ela corre para dois lados igualmente, para o futuro e para o passado, sempre há algo interessante para saber do passado de um personagem e os flashbacks ajudam muito nisso… quando eles são mostrados uma vez. Acontece que na série nós vemos, por exemplo, um flashback com o Naruto ainda criança sendo rejeitado pelos outros pelo menos 10 vezes em 4 episódios, não é em um novo ângulo, não é uma reformulação da ideia, é a mesma cena repetida 10 vezes em 4 episódios seguidos e na maioria das vezes a cena de flashback nem foi criada para essas repetições, as vezes é um trecho de um episódio exibido no mês anterior, as vezes uma cena de um episódio da série clássica.



Então, com 4 minutos de coisas acontecendo por episódio era de se pensar que pelo menos esses quatro minutos seriam um primor, certo? Mas também não, muitas vezes o Estúdio decide prender a história por 5 episódios de “pré-luta” que são apenas slides com a boca do personagem mexendo em conversas que muitas vezes estão ali frisando temas e pontos dos personagens que nós já conhecemos. Sem contar que as atuais batalhas de Naruto, que é um anime de luta, transformaram toda a plástica e movimentos bacanas que tínhamos no início da série em uma versão pavorosa dePower Rangers, onde os heróis praticamente estão dentro de megazords que atiram bolas enormes de energia de um lado para o outro, porque isso? Simples, é mais fácil de desenhar.

Se Naruto Shippuden fosse feito nos moldes de A Lenda de Korra, os mais de 400 episódios que a série tem, teriam sido transformados em 50 episódios épicos que fariam a série virar um marco dentro dos animes, uma espécie de novo Death Note que é um dos poucos animes que mesmo quem odeia anime gosta. Não importa quantos mangás a série tem, em uma animação de 22 minutos você consegue inserir o conteúdo de quase uma dezena de mangás se você aproveitar bem esses minutos. Mas é como eu disse, a forma ocidental e oriental de trabalhar com suas animações são bem diferentes e isso deve explicar o trabalho porco que o Estúdio Pierrot faz, certo? Sim e não e é aí que as coisas ficam verdadeiramente sombrias.

Os estúdios japoneses de animação para TV têm condições de trabalho que beiram a escravidão e quem lidera isso de certa forma é o Estúdio Pierrot, sendo o maior do ramo no país. E não pensem que é assim apenas pela quantidade absurda de coisas que eles têm que produzir semanalmente, mas sim porque para conter gastos muitos estúdios simplesmente começaram a cortar funcionários e sobrecarregar os que sobraram.



Para os funcionários que se matam de trabalho enquanto estão lá o salário é simplesmente péssimo, o estúdio Pierrot paga cerca de U$ 2,00 por desenho, ou no caso um frame, ou seja, para você conseguir receber mil dólares no mês, você tem que fazer 500 desenhos, se você trabalha de segunda a sábado você tem que fazer mais de 20 desenhos por dia e se você perguntar a qualquer desenhista profissional, 20 desenhos por dia é muito mais do que deveria ser possível fazer e U$ 1000,00 no mês é bem menos que um desenhista deveria ganhar por um trabalho desse tamanho. Ainda assim isso é considerado bom lá no Japão, porque estúdios menores do que o Pierrot, como o Nakamura Pro, pagam U$ 300,00 pela mesma quantidade de trabalho, o que beira o nível da ilegalidade… não, vamos ser honestos, isso ultrapassa e muito o nível da ilegalidade.

De acordo com uma entrevista do animador americano Henry Thurlow, que trabalha no Estúdio Pierrot, não é difícil ver pessoas vomitando em suas próprias mesas graças ao excesso de trabalho. Numa entrevista semelhante, o animador japonês Hiroyuki Yamashita que também trabalha noPierrot e mais especificamente em Naruto, muitas pessoas têm ferimentos graves nas mãos e nos braços graças ao excesso de trabalho.

Apesar de Thurlow dizer que sua vida está “completamente horrível”, ele afirmou que se sente completo como artista trabalhando para o Pierrot, o que me faz pensar que pode ser um caso dele estar contaminado com o seu próprio trabalho ou quem sabe quase uma lavagem cerebral, porque voltando a parte artística não há como alguém estar satisfeito trabalhando em um estúdio que entrega esse tipo de coisa:
















Considerando as péssimas condições de trabalho que o Estúdio propõe e o salário miserável que ele paga, eu consigo entender perfeitamente porque diabos a qualidade de praticamente tudo que eles fazem é péssimo, talvez U$ 1000,00 dólares por 20 desenhos por dia seja um salário que eu aceitaria, afinal já viu quanto o dólar está valendo aqui no Brasil né? E sim, eu aceitaria por um simples motivo… EU NÃO SEI DESENHAR! Entregar 20 rascunhos toscos talvez seja mais fácil e isso explica a qualidade decadente de Naruto através dos anos, isso explica também porque os melhores artistas que são menos deslumbrados pelo que fazem lá estão migrando para mercados como o da Coreia do Sul, Vietnã e até China. Quando as pessoas estão indo para China para evitar trabalho (semi) escravo tem algo muito errado acontecendo.



Quem é muito fã de Naruto costuma defender até a queda notável na qualidade do anime, mas é difícil defender as condições de trabalho que o estúdio Pierrot promove. Entretanto é difícil enxergar também uma luz no fim do túnel para ambos os casos, para a animação, talvez uma versão “Naruto Shippuden Kai” com o material do Pierrot reeditado e redesenhado por um estúdio mais competente, como o que faz as animações pro jogo Naruto Ultimate Ninja Storm da Namco, resolveria um dos problemas, mas será que a política japonesa é capaz de resolver o outro? Ou melhor, será que a política japonesa se preocupa em resolver o outro? Eu acredito que não porque essas críticas dos funcionários para com os estúdios existem abertamente há muito tempo e sem procurar muito eu consigo achar dezenas dessas reclamações expostas de uma forma ou de outra na internet e que datam desde 2009 até agora, se nada foi feito até hoje, na verdade, se tudo piorou agora, talvez esse problema nunca seja resolvido, exceto que isso parta dos próprios artistas que podem começar a forçar o modelo ocidental de série de TV para seus trabalhos ou quem sabe, se deslumbrarem menos pela arte que estão fazendo e se preocupar mais com o valor de seu trabalho e não se sujeitarem ao que é imposto pelos estúdios.

E a gente pensando que Madara era o grande vilão do anime.

Fonte/Via: overtice.com.br